No Brasil, 31 de outubro é uma data dupla. De um lado, temos o Halloween, celebração de origem celta que conquistou o mundo. Do outro, o Dia do Saci, criado oficialmente para valorizar o folclore nacional e resgatar personagens como o Saci-Pererê, a Cuca e o Boitatá. É uma coincidência que acabou se transformando em disputa simbólica entre o global e o local, entre o que consumimos e o que representamos.
As raízes antigas do Halloween
O Halloween surgiu de um festival celta chamado Samhain, celebrado há mais de dois mil anos em regiões que hoje correspondem à Irlanda, Escócia e norte da França. O Samhain marcava o fim das colheitas e o início do inverno, quando se acreditava que o mundo dos vivos e dos mortos se misturava.
Com o tempo, tradições pagãs foram absorvidas pelo cristianismo e ligadas ao Dia de Todos os Santos, comemorado em 1º de novembro. A véspera dessa celebração era chamada em inglês antigo de All Hallows’ Eve, que acabou se transformando em Halloween.
Segundo o History Channel, a festa moderna começou a se consolidar nos Estados Unidos no século XIX, com a chegada de imigrantes irlandeses. Hoje, o Halloween é um fenômeno global, misturando diversão, fantasia e uma boa dose de comércio.
A criação do Dia do Saci no Brasil
O Dia do Saci foi proposto em 2003 por meio de um projeto de lei federal de autoria do deputado Aldo Rebelo. A ideia era valorizar o folclore brasileiro e oferecer uma alternativa nacional ao Halloween.
A lei federal não chegou a ser sancionada, mas a proposta inspirou vários estados e municípios. Em São Paulo, por exemplo, o Dia do Saci é reconhecido oficialmente desde 2004. O objetivo, segundo o texto original, era promover a cultura popular e resgatar a valorização das tradições brasileiras.
O historiador Rodolfo Hiroshi explica que o propósito da data é pedagógico. Para ele, a intenção não é combater o Halloween, mas lembrar que o Brasil tem seus próprios mitos e histórias. A ideia é reforçar a identidade cultural sem precisar excluir outras tradições.
Já o pesquisador Rodolfo Grande Neto, especialista em História da Arte, diz que o Dia do Saci mantém o brasileiro instigado sobre a própria cultura. É uma oportunidade de refletir sobre como valorizamos o que é nosso.
Conflito cultural ou convivência possível?
A coincidência das duas datas não é um acidente. Foi pensada justamente para colocar o folclore brasileiro lado a lado com uma tradição estrangeira. Alguns veem nisso uma disputa, outros, uma chance de diálogo.
Há quem critique a ideia de criar uma celebração por lei. Segundo estudiosos da cultura popular, tradições não se impõem por decreto, mas se formam com o tempo, pela repetição e pela afetividade. Ainda assim, leis podem servir como ponto de partida para reintroduzir símbolos esquecidos.
Pesquisadores também lembram que o Saci-Pererê tem origens profundas, ligadas a mitos indígenas e influências africanas. O personagem é uma síntese do Brasil, com camadas históricas e simbólicas que vão muito além do simples “travessura folclórica”.
A professora e folclorista Cléo Martins observa que o Saci é resistência cultural. Ele representa o poder de adaptação do povo brasileiro, que ri, engana, enfrenta e sobrevive.
Halloween nas escolas e a convivência das tradições
Na prática, o Halloween continua sendo muito mais popular, principalmente entre as crianças. Escolas, shoppings e redes sociais adotam o tema com naturalidade, enquanto o Dia do Saci ainda é pouco conhecido.
Mas talvez essa não precise ser uma guerra. Muitas escolas hoje mesclam as duas festas. As crianças se fantasiam de bruxas e fantasmas, mas também aprendem sobre o Saci, a Iara e o Curupira. O resultado é uma mistura divertida, que mostra que tradição e cultura não precisam ser excludentes.
Como pai, continuo achando bonito ver a escola do meu filho enfeitada e as crianças fantasiadas. É uma festa à fantasia, um dia de imaginação e brincadeira. E, convenhamos, tem coisa mais saudável que isso?
Conclusão
O Dia do Saci e o Halloween representam dois lados da mesma moeda. Um fala sobre raízes e identidade. O outro, sobre intercâmbio cultural e reinvenção. Nenhum precisa eliminar o outro. O importante é compreender de onde vêm nossas histórias e o que elas dizem sobre nós.
O Brasil tem espaço para o Saci, para as bruxas e para qualquer personagem que desperte curiosidade, imaginação e encantamento. Porque, no fim das contas, celebrar é também uma forma de aprender quem somos.
A escolinha do Padawan está toda enfeitada para o Halloween. Como era de se esperar, todas as crianças foram fantasiadas. Acho ótimo, porque no fim das contas é uma grande festa à fantasia. Todo mundo se diverte, ri, brinca e solta a imaginação. E tem algo mais saudável que isso? Olha só a fantasia do Padawan 🙂
